Este blog, criado em janeiro de 2007, é dedicado à minha filha Flavia e sua luta pela vida. Flavia vive em coma vigil desde que, em 06 de janeiro de 1998, aos 10 anos de idade, teve seus cabelos sugados pelo sistema de sucção da piscina do prédio onde morávamos em Moema - São Paulo. O objetivo deste blog é alertar para o perigo existente nos ralos de piscinas e ser um meio de luta constante e incansável por uma Lei Federal a fim de tornar mais seguras as piscinas do Brasil.
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A FACE OCULTA DO COMA (*)

- 20 de julho de 2008
(*) Título da reportagem de Silvânia Arriel, feita comigo e Flavia para a revista ENCONTRO de Belo Horizonte, Minas Gerais, edição de 15 de Julho, que aborda basicamente "o drama de famílias que cuidam em casa, durante anos, de parentes em coma".

Odele Souza, com a filha Flávia: “Quando ela desce para tomar sol, vai com a roupa combinando”

"Tão longe e tão perto: a filha ali, ao lado, alheia, parada, inconsciente enquanto a vida continua a produzir histórias alegres, tristes, indiferentes na engrenagem pontual dos dias. São 10 anos ou 126 meses ou mais de 3,8 mil dias sem falar, saber o que ocorre à sua volta, expressar carinho, praticar atos voluntários. É a metade de sua existência de 20 anos: de criança, entrou na adolescência, na juventude submersa num mundo à parte, impenetrável. “Tantas coisas você perdeu nestes 10 anos, um tempo que não dá para recuperar”, escreveu Odele Souza para a filha Flávia, em coma vígil, no Dia das Mães, postada no blog que alerta serem corriqueiros acidentes como o que ocorreu com a garota. Fotos da menina linda, alegre, brincando de bailarina condensam aqueles poucos anos de vida bem, saudável, tirada em poucos segundos por falta de oxigenação no cérebro, no dia 6 de janeiro de 1998, num acidente inimaginável na piscina no condomínio Jardim da Juriti, onde morava em São Paulo.

O ralo sugou seus cabelos e a deixou sem capacidade de interagir com o meio e as pessoas, mas com as funções orgânicas preservadas. Dorme, acorda, abre e fecha os olhos (daí o nome coma vígil), aparenta reagir a estímulos, se alimenta por sondas. Do ponto de vista da neurologia, um quadro considerado irreversível. Nem mesmo o despertar do polonês Jan Grzebski no ano passado, depois de ter vivido 19 anos em coma, ou de outros casos que aparecem sinalizam alguma possibilidade de mudança. “Quanto mais tempo demora em estado de coma, menos chances de reverter o quadro”, diz o médico Josaphat Vilela de Moraes, chefe da clínica de neurocirurgia do Hospital de Pronto-Socorro João XXIII (HPS), de Belo Horizonte.

Odele Souza sabe disto, não tem esperança de ver a filha consciente, inserida novamente neste nosso mundo. Mas faz de tudo para que as coisas boas deste mundo cheguem a ela. Expurga o ruim: a dureza, a frieza, a impessoalidade dos hospitais. “Por mais equipadas, as clínicas não têm calor humano”, diz. Está em casa, cercada do carinho da mãe, atenta aos cuidados necessários e também à feminilidade da jovem. Faz as suas unhas e esmera no visual. “Quando ela desce para tomar sol na área do prédio, vai com roupa combinando, brincos, presilhas no cabelo.” Faz parte da rotina cadenciada da filha: todos os dias, às 6h, acorda, tem a dieta com leite e suplemento, às 8h a primeira medicação, escova os dentes, toma banho, penteia os cabelos, escolhe a roupa, às 9h30, fisioterapia, com exceção dos domingos. De 10h30 às 13h30 fica sentada numa cadeira para facilitar a respiração, na área do prédio ou no quarto. Depois volta para a cama, recebe alimentação por sonda, é colocada em outra posição. Odele conversa com ela, como na carta escrita no Dia das Mães, em que relembra o pano de prato com o desenho de suas mãos pintadas, que ganhou de presente. Amanhã é outro dia, tudo recomeça sem a esperança de ver a filha falar, andar.

A mãe não se lamuria, nem se estressa de ter que acordar todos os dias às 5h30 para que o ritual seja seguido à risca. Sabe que está dando à filha o que nenhum hospital poderia oferecer: o manuseio respeitoso do corpo, a convivência direta afetuosa e a observação de cada progresso, de cada manifestação. “Aprendi a ler a expressão no seu rosto. Sei quando está com tensão pré-menstrual, quando sente dores”, relata. Aprendizado que veio com o tempo, com a transposição da tristeza por ver a filha viva, mas em coma. “Fiquei de luto profundo por dois anos .” Teve de se adaptar à nova vida que se apresentou depois do acidente, à perda do emprego de secretária bilíngüe, à aposentadoria involuntária, tudo com resignação ou se tornar vítima.

Pronto: partiu para a luta, aprendeu a lidar com a filha, a se revezar com uma auxiliar de enfermagem e reduzir custos. Nas folgas, reserva parte do dia para ir a exposições, teatro, cinema, e evitar o estresse tão comum em pessoas que lidam com doentes. Hoje, teria de gastar nove mil reais para suprir todas as necessidades de Flávia, o que não ocorre. “Falta fonoaudiólogo.” Ela batalha para isso, mas se diz barrada pela lentidão da Justiça, nestes dez anos, na sua busca por indenização pelo acidente....Propuseram 100 mil reais. “Não aceitei... Disseram que eu ia ficar rica. Eu era rica quando ela estava bem,” afirma. Continua a sua luta pela indenização e de alertar no seu blog que acidentes como o que ocorreu com Flávia são mais comuns do se pensa. “Estou exercendo o meu direito de cidadania e o da minha filha, que lhe foi tirado.”

A reportagem menciona outro caso de coma prolongado além do Flavia, o de Renata Vieira, em coma há seis anos. É a moça que está na primeira foto que ilustra o artigo. Para ler o texto completo, clic em REVISTA ENCONTRO.

Mídia, desde que não seja sensacionalista, é sempre bem vinda para divulgar o caso de Flavia e alertar para o perigo dos ralos de piscinas. Obrigada Silvânia por esta reportagem.

Até o próximo post.
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